Amigos,
Escrevi recentemente que ver filmes é uma das saídas que eu encontro para fugir da realidade, quando as coisas não estão boas para mim. A música também é uma válvula de escape. Quando preciso melhorar a minha auto-estima, eu ouço "Amanhã" com Guilherme Arantes até ficar completamente exausta. O legal é que funciona, parece até que tomei alguma droga.
Conheci os Beatles em 1964, quando tinha apenas 10 anos. O primeiro sucesso deles aqui no Brasil foi "I wanna hold your hands" e eu me apaixonei perdidamente. Comprava todos os discos que eram lançados, até que em 1965 entrei para o Ginásio com onze anos incompletos em uma turma que a grande maioria tinha doze. Essa diferença de um ano fez com que eu ficasse marginalizada, não só por essa razão como também pelo fato de que a minha mãe me levava e pegava na escola. Os demais alunos andavam sozinhos. Só quem falava comigo eram os CDF's como eu que também eram marginalizados. Vocês já viram aqueles filmes com adolescentes lindos que maltratam os desengonçados? É por aí.
No ano seguinte, fiz a segunda série e conheci a V. que era linda e namoradeira, mas não fazia parte de nenhum grupo. Ali começou uma grande amizade que infelizmente terminou por causa do tempo e da distância. Ela foi morar nos EUA quinze anos depois, porque queria fumar maconha sem se sentir paranóica com medo de ser presa. Nós tínhamos uma paixão em comum: BEATLES. Sabíamos tudo da vida deles, éramos fãs, mas tínhamos a certeza de que nunca berraríamos em um estádio. Eles nunca foram objeto de paixão do tipo "algum dia, o nosso predileto virá para o Brasil, nós vamos nos casar e seremos felizes para sempre". Nós gostávamos dos músicos e não dos rapazes.
Enquanto V. era paquerada pelos garotos e eu vivia no meu mundinho recluso, nós ouvíamos os Beatles. Nesse meio tempo, meus pais se separaram e tudo ficou pior, porque minha mãe começou a dar os primeiros sinais de que se tornaria uma pessoa depressiva até o final da vida. Tudo era triste para mim e ouvir aquele conjunto fazia com que eu me sentisse melhor. Sabia todas as letras de cor. Eu era uma adolescente cheia de problemas e todo mundo achava que eu era um anjo de candura por ficar reclusa em um quarto ouvindo músicas o dia inteiro. Não dava trabalho algum.
Eis que em 1968 (com 14 anos) aconteceu uma coisa maravilhosa: as espinhas desapareceram, a cintura ficou 25cm mais fina que os quadris e o meu rosto perdeu aquele estranho semblante (já escrevi um post com o título "1968, o ano que nunca deveria ter terminado"). Fiquei bonitinha e a minha escola tomou uma atitude simpática: colocou todos os CDF's em uma única sala. Quando estava terminando o ginasial, finalmente encontrei a minha turma. Éramos jovens iguais aos outros, mas tínhamos tranqüilidade para tirar um DEZ em matemática, sem ter que pedir desculpas a ninguém. V. não estudou mais comigo porque ela ficou reprovada no ano em que nos conhecemos. Ainda assim, éramos carne e unha.
Curtimos tudo que os Beatles puderam nos oferecer. O impacto causado pelo LP "Sargent's Pepper Lonely Hearts Club Band" foi tão forte que eu jurei de pés juntos que nunca, jamais alguém poderia fazer algo parecido. Ouvir "I get by with a litle help from my friends" foi qualquer coisa de MARAVILHOSA, principalmente porque os Rollings Stones lançaram na mesma época aquele disco "Flower". Se eles já estavam se tornando sofisticados, mais ainda eles se tornaram deuses. Foi um período cultural e artisticamente falando tão forte que vai demorar algum tempo para ser superado.
Eu e V. juntas, como sempre. Ela tão fã quanto eu, mas não dependente da mesma forma. Eis que em 1969 conheci o primeiro amor de minha vida, o rapaz que me introduziu no mundo das maravilhas e a partir daquele momento eu descobri que poderia andar por conta própria.
E assim eu passei de uma pessoa cheia de pequenos problemas para se tornar um outro alguém com enormes problemas, rsrsrs. Os Beatles se separaram. Um ladinho Papai Noel meu acredita que eles só tomaram essa decisão depois que eu decidi caminhar o meu trajeto de vida com os meus próprios pés, sem que tivesse algum fundo musical dizendo qual o sentimento que eu deveria ter.
Continuei amando os Beatles da mesma forma, mas eles não eram mais tão imprescindíveis para mim. Quando ouço "I wanna hold your hands" eu sinto a mesma felicidade de 43 anos atrás, mas sei que essa música deixa um pouco a desejar.
Muitos anos depois, minha filha quis ter o CD dos "Backstreet boys" que estava em falta no mercado por causa da grande procura. Ela estava desesperada e eu também. Liguei para a Modern Sound (RJ), após uma exaustiva pesquisa e eles disseram que tinham apenas dois CD's. Pedi desesperadamente para que o vendedor, que já me conhecia, para reservar um para mim, sob o meu compromisso de ir até lá de noite para comprar. E assim foi feito. Esse CD IMPORTADO custou em 1998 ou 1999 (acho eu) em torno de 20,00 mais o táxi para ir e voltar. Convém esclarecer que era o aniversário de um parente e o tempo era curto para resolver aquele "grande" problema. A loja estava quase para fechar e não houve opção de ir de ônibus. As corridas foram pagas com dinheiro e o CD com cartão de crédito.
Dessa forma, paguei uma verdadeira fortuna para alguém que, naquele momento, estava duríssima, mas a felicidade que senti ao ver a minha filhota se trancar no quarto para ouvir aquele conjunto foi maior do que tudo, ainda que ela tenha sido muito grosseira comigo. Ela precisava sofrer e sonhar e eu respeitei aquele momento. Eu me vi ali naquele pequeno infortúnio dela. Ela não teve o dissabor que eu tive, mas o sofrimento dela (tal qual o meu) foi o maior do mundo, rsrsrs. Todo jovem acha que ninguém sofre tanto quanto ele.
Bom, para finalizar, gostaria de dizer que no dia 06 de julho de 1957, John e Paul se conheceram, apresentados por um amigo em comum. O mundo se tornou um lugar melhor.
Beijocas
Yvonne
P.S.: Você que é paulistano, leia o post abaixo e divulgue para os seus amigos.
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