Se todos os dias são iguais, torne-se diferente

Yvonne

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Brasileira, ariana nascida no Rio de Janeiro, morando atualmente em Guarapari, mulher, esposa e mãe. Gosto de artes em geral, de ler, de trocar idéias, de praia, de cinema, de tomar cerveja e de dar boas gargalhadas.

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DA SÉRIE YVONNE E SEU UMBIGO - VOVÔ CAMILO



Amigos, infelizmente o pai da minha querida Sandra faleceu. Dourado, querendo de uma certa forma homenagear o amor que ela tinha por ele, escreveu um lindo post sobre o pai dele. Achei a idéia interessante e resolvi republicar um texto escrito há algum tempo no Nós por Nós onde contei o meu relacionamento com o meu pai também. Só que o meu post não foi tão bonito.

Liguei para a Sandra para dar o meu ombro amigo e acabei sendo consolada quando ela me disse a seguinte frase: "Não escreve aquele texto não. Perdoa o seu pai. Você vai se sentir bem melhor sem essa mágoa". Bom, ainda vai demorar algum tempo para eu chegar a esse ponto e por esse motivo decidi postar hoje uma declaração de amor ao meu avô que eu escrevi para o meu querido ex-grupo do Yahoo em 2003. Espero que gostem.



Ontem li na revista Marie Claire uma entrevista com a adorável atriz Nathália do Vale e num dado momento ela falou que sua primeira novela foi "Gabriela" que passou em 1975. Levei um susto imenso, já vai fazer 30 anos daqui a pouco. O tempo passou muito rápido e eu nem me dei conta. Tive a nítida sensação que a juventude está escapando das minhas mãos, tal qual água quando tentamos pegar.

Essa novela marcou muito a minha vida, em primeiro lugar pela história de Jorge Amado que é simplesmente magnífica. Em segundo lugar por causa do personagem do Paulo Gracindo que lembrava muito o meu avô, falecido dois anos antes. Além daquele ator ser muito parecido fisicamente com ele, o Coronel Ramirez (acho que era esse o nome do personagem) tinha uma postura exatamente igual a do meu avô, homem nordestino que resolve problemas a bala, patriarca de uma família e, porque não dizer, de um clã também. Além disso tudo, tinha um amor imenso pela neta. Quando apareciam as cenas em que os dois conversavam, eu e mamãe chegamos a chorar algumas vezes porque eu era a neta que ele mais amava e a única que tinha paciência para ouvir suas histórias. Nós éramos uma dupla, Vovô Camilo e eu. Se não tive um pai presente, o meu avô preencheu essa lacuna com louvor.

Era um homem cheio de defeitos: intransigente, insuportável, brigão, anti-comunista ferrenho, não tinha a menor paciência para conversar com gente jovem, ignorava os demais netos que ele chamava de atrabiliários e outras coisas mais que somente quem conhece os "coronéis" nordestinos sabe. Era uma espécie de ACM, só que do bem e tinha uma IMENSA qualidade: era um homem justo, incorruptível, que lutou feito um leão enlouquecido pelos pobres e contra a injustiça social, apesar de não comunista. Tendo feito apenas o ginásio, trabalhou como advogado em várias questões. Não me perguntem como, são coisas que só aconteciam no Brasil, no início do século passado. A palavra do meu avô valia mais do que qualquer título bancário. Mesmo velho, era temido e respeitado por todos. Nunca conheci um homem que olhasse para ele de igual para igual, todos olhavam de baixo para cima, inclusive meu pai e tios. Era um homem gigantesco no sentido literal e figurado da palavra e nunca negou o seu ombro amigo para quem quer que seja, inclusive para os seus inimigos políticos quando esses eram injustiçados. Se tivesse continuado na política, poderia ter sido um grande presidente da república e talvez nós brasileiros não tivéssemos tanta vergonha de nossos governantes, pois ele não aceitava conchavos, comissões de 10% e outras coisas do gênero. Ainda bem, teria sido assassinado.

Vovô nunca me deu um beijo ou disse que me amava, mas não precisava, eu desde garota sabia que era o bálsamo da vida dele. Quando ele e minha avó moraram em nossa casa em um determinado período, invariavelmente todas as tardes ele me dava dinheiro para comprar biscoito de polvilho que ele chamava de "mentirinha carioca". Ficávamos os dois tomando café com leite, comendo os biscoitos e ele contava várias histórias. Ninguém poderia interromper a nossa conversa, aquele momento era só nosso. Recitava poemas sem fim de todos os grandes poetas brasileiros e portugueses, inclusive. Era um homem cultíssimo, uma enciclopédia e um dicionário vivos, nunca houve uma palavra que ele não soubesse o significado.

Era o meu ídolo e foi nele que eu me espelhei para ser a pessoa que eu sou no que diz respeito a decência e caráter. Lembro-me bem dele sempre dizer para mim que a única coisa que ninguém tira da gente é o estudo e o caráter, o resto tudo se perde: família, amigos, dinheiro, prestígio e até a saúde. Sempre me incentivou a estudar e a nunca depender de homem algum, eu tinha que ser a dona absoluta da minha vida. Seu último presente para mim foi a taxa de inscrição para o concurso para o banco estatal onde trabalhei por muitos anos da minha vida, o seu sonho era me ver em um alto cargo e poderosa. Ele morreu aos 86 anos logo em seguida, antes mesmo que eu tivesse feito a prova. Não consegui ser a poderosa chefona, mas acho que o deixei bastante orgulhoso lá no outro mundo.

Beijocas

Yvonne

UPDATE: A respeito do que falei que o meu avô exercia a função de advogado, mesmo não tendo feito faculdade, leiam o comentário da Kith que esclareceu o assunto que para mim era totalmente desconhecido.