Se todos os dias são iguais, torne-se diferente

Yvonne

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Brasileira, ariana nascida no Rio de Janeiro, morando atualmente em Guarapari, mulher, esposa e mãe. Gosto de artes em geral, de ler, de trocar idéias, de praia, de cinema, de tomar cerveja e de dar boas gargalhadas.

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CIDADES 2 - Salvador




Amigos, o texto abaixo foi publicado no Nós Por Nós há algum tempo. A turma antiga já conhece, mas a maior parte de vocês não. Como vez por outra falarei sobre cidades que já visitei e gostei ou não, decidi publicar mais uma vez.

Mais uma recordação para vocês. O ano foi 1978, estava tudo planejado para eu passar o carnaval com um antigo namorado na casa de sua avó em Guaratinguetá. Iria toda a família dele. Se não me falha a memória, parece que essa cidade fica próxima a Serra da Bocaina ou de alguma reserva ecológica. Sinceramente, não me recordo mais. Não fiz a tal viagem porque o namorado terminou o relacionamento alegando a maior conversa fiada. Fiquei muito chateada, chorei muito e decidi passar o carnaval em Salvador, seria a primeira vez que eu iria àquela cidade. Um grupo de amigos iria para lá. Quando quis comprar a passagem de avião, só tinha para o domingo. Um outro rapaz (que eu não conhecia) tinha sido corneado pela noiva. Ele era amigo de uma das meninas do grupo e lá fomos nós juntos para Salvador no domingo de manhã. Ainda bem que eu fui com ele.
Lá chegando é que eu fui saber que eu iria ficar hospedada em um hotel próximo a Praça Castro Alves, a única espelunca que sobrou, mas ainda assim fiquei feliz ante a possibilidade de finalmente conhecer o carnaval baiano, tão falado no Brasil inteiro ( A Praça Castro Alves é do povo, como o céu é do avião...) . Esqueci de falar o que aconteceu antes de eu chegar no hotel. Pegamos um táxi e obviamente tivemos que saltar antes porque as ruas estavam fechadas. Lá fomos nós a pé, eu de salto e com uma sacola de mão enorme e pesada. O rapaz, que já esqueci o nome, estava mais ou menos arrumadinho também. Tivemos que passar por dentro de um trio elétrico até chegar ao hotel, o rapaz segurou a minha mão porque estava com medo que eu levasse um tombo ou fosse levada para o além. Ele assustado e eu perplexa.
Bom, finalmente chegamos ao hotel e qual não foi a minha surpresa quando eu soube que eu iria dormir com ele porque só tinha um único quarto reservado para nós dois. Bom entramos em entendimento, combinei que eu iria apenas dormir e a minha sacola de mão ficaria no quarto das amigas. Ele foi super cavalheiro e realmente não tenho nada do que me queixar. Para falar a verdade, ele estava a fim de cair na gandaia e decididamente eu, amiga de uma grande amiga dele, não era a companhia ideal para ele naquela situação. Ele queria as baianas e não uma carioca.
Hospedada, banho tomado, bonitinha, lá fui eu com os amigos para a famosa Praça Castro Alves. Meu Deus do céu!!!! Nunca vi nada igual, fui forçada a brincar em cada trio elétrico que aparecia. Simplesmente eu não tinha para onde ir, eu era levada pela multidão sem que tivesse a menor condição de me desvencilhar. Achei interessante, mas continuava perplexa com a alegria e energia do povo baiano e dos turistas que estavam lá. Com duas ou três horas de folia, eu já estava me sentindo profundamente arrependida, mas fiquei calada, pois estava todo mundo feliz e afinal de contas eu estava no famoso carnaval da Bahia ( Atrás do trio elétrico só não vai quem já morreu ...). Será que estava havendo algum problema comigo?
Esqueci de contar o principal dessa história: o grande hit daquele carnaval foi Pombo-Correio do Moraes Moreira. Cada vez que a música de um trio elétrico terminava, eles colocavam essa, até chegar o novo trio elétrico. Então era Pombo Correio vinte e quatro horas por dia como música de descanso. Todo mundo pulava mesmo na hora do descanso.
Voltamos para o hotel para tomar banho, jantar e sair de novo para curtir mais carnaval. Eu entristecida, mas fazendo gênero de que estava me esbaldando e só aí que eu fui me dar conta de que o som dos trios elétricos chegava até o hotel como se tivesse bem ao lado, aliás era dentro do quarto. E tome de Pombo Correio. Saímos, dançamos e tudo mais. Quando chegou de madrugada, eu simplesmente não consegui dormir. Cadê o rapaz? Eu precisava de alguém para falar alguma coisa. Porque não trouxe um livro? Devo ter dormido umas 5 horas da manhã para acordar logo em seguida. Sabe ao som de que? Pombo Correio.
Feito um zumbi fui tomar o café da manhã para sair e curtir mais festa. Eu estava acostumada a brincar carnaval em bailes, bandas ou escolas de samba que terminam em alguma hora. Nunca poderia imaginar que uma festa pudesse durar 24 horas por dia por 7 dias seguidos. Acho que nem em Sodoma e Gomorra foi assim. Devo ter comido um pão com queijo ao som de Pombo Correio, me arrumei ao som de Pombo Correio e fui para a Praça Castro Alves que tocava sabe que música? Pombo Correio. Fiquei pensando se não teria sido melhor ficar no Rio, em casa chorando e com a cabeça cheia de chifres. Mas lá fui eu representar o meu papel de feliz e dizer para as pessoas: realmente o carnaval de Salvador é maravilhoso, é uma festa do povo.
Lá fomos nós curtir mais Pombo Correio. Não sei por qual motivo, mas teve um determinado momento em que ficamos em um local que não foi legal, bem atrás de um trio elétrico que era considerado o melhor (não sei o nome). Meu Deus do Céu!!!!!!! Sabem aqueles filmes de guerra em que há uma multidão fugindo do inimigo e as pessoas que estão juntas se separam? Vivi um momento desses. Teve uma hora em que só ficou eu e uma menina chamada Mônica que era bem magrinha. Eu agarrei a mão dela com tanta força que as minhas unhas marcaram sua pele. Apareceu um negão imenso e eu pedi a ele pelo amor de Deus que nos tirasse dali. Ele nos agarrou e nos deixou em um local menos tumultuado. Ficamos encostadas em um muro um pouco mais distante e começaram a aparecer uns caras esquisitos que ficaram nos observando como se fôssemos uma picanha e um contrafilé. A Mônica estava assustada e nem reparou os caras, mas eu sim e disfarçadamente fui andando com ela e voltei para a multidão. Finalmente esse trio elétrico acabou, voltou Pombo Correio e eu disse para a Mônica que iria voltar para o hotel.
Quando finalmente estavam todos de volta combinando a farra da noite, eu disse que não poria mais os pés na rua até que tivesse condições de pegar um táxi, tentar pegar um avião para voltar para o Rio. Bastou eu falar isso para todo mundo concordar comigo, ninguém estava gostando de nada e estavam que nem eu: fazendo gênero. Finalmente meu acompanhante de quarto apareceu e disse que tinha passado o dia em Itapoã. Explicou direitinho para a gente como é que deveríamos fazer para chegar lá sem necessariamente passar pelos blocos para poder tomar um táxi. Ficamos no hotel na noite de segunda conversando até não podermos mais para conseguirmos dormir e acordar bem cedinho para sair.
Foi o que fizemos e finalmente comecei a curtir Salvador. Fiquei completamente apaixonada pela cidade. A praia não era bem o que eu imaginava, mas ainda assim foi muito bom. Tinham poucas pessoas, todo mundo curtindo o mar, a natureza, peixe frito, cerveja, sem nenhuma balbúrdia. Pouquíssimas pessoas, fora a Praça Castro Alves, a cidade estava vazia. Fizemos outros passeios nesse mesmo dia e estávamos entristecidos ante a possibilidade de voltar para o hotel, mas ainda assim tínhamos que voltar. Não preciso dizer que lá retornando estava tocando Pombo Correio, mas estava tão cansada que acabei dormindo.
Este carnaval de 1978 foi um dos poucos da minha vida que eu passei fora do estado do Rio de Janeiro e como tinha planejado ir à Guaratinguetá, pedi ao meu chefe que me deixasse faltar os três dias após a festa. Ainda bem, porque eu só fui curtir Salvador na terça-feira de carnaval. Na quarta, como vocês já devem saber, a festa ainda está a toda, mas eu e meu grupo fugimos de qualquer algazarra momesca e mais uma vez fomos parar em outras freguesias. Nos divertimos como nunca. Meu companheiro de quarto, cada vez mais sumido, desapareceu de vez pois arrumou um baiana que era um verdadeiro monumento: mulata, mais ou menos 1.70 de altura, olhos amarelos, dentes de porcelana e corpo tipo a da Globeleza, ainda tenho o rosto dela gravado na minha memória de tão lindo. Ele, branquela, feio, tímido e sem graça. Disse para a gente que não voltaria mais para o Rio. Não sei com que atributos ele conquistou aquela mulher, era muita azeitona para a empada dele.
Bom, os dias restantes foram todos maravilhosos, principalmente depois que acabou o carnaval. Visitamos muitos lugares e eu fiquei encantada e apaixonada por tudo, principalmente por aquele povo tão peculiar. Uma noite, fomos a um barzinho que nos foi recomendado como ótimo, mas não foi especificada a razão. Realmente, nunca vi nada igual, era um espaço enorme com uma espécie de corredor no meio, de um lado homossexuais, do outro os heterossexuais. Uma turma não provocava a outra. Ficamos no lado dos heteros e a paquera correu solta. Nosso grupo tinha dois casais e três moças sozinhas (eu, Mônica e Telma). Os rapazes olhavam para as moças descaradamente, sem a menor preocupação se estavam sendo ridículos ou não. Nós três saímos de lá acompanhadas e aí é que a estadia em Salvador ficou melhor ainda, todo mundo apaixonado e fazendo juras de amor eterno.
Mas tudo que é bom dura pouco, chegou domingo à noite e a volta para a nossa vida normal. Saí de Salvador com o coração apertado. Todo mundo percebeu que eu estava com uma cara maravilhosa e quando me perguntaram se eu tinha gostado da viagem, eu respondi que não recomendaria o carnaval baiano ao meu pior inimigo, já Salvador é outro papo, eu adorei.
Bom, nunca mais vi ninguém. Perdi o contato com os dois casais, a Mônica foi morar no Canadá, a Telminha se casou com o fã que ela arrumou no bar homo/hetero e foi morar em Salvador, espero que o meu acompanhante de quarto tenha conseguido ser feliz com a Globeleza, o namorado carioca que me chifrou quis reatar o namoro mas eu não o aceitei mais e o namoro com o baiano não resistiu ao tempo e à distância, mesmo que de início nos falássemos todas as noites por telefone e fizéssemos milhões de planejamentos para ficarmos juntos.
Apesar dessa música ter me levado ao desespero nos primeiros dias, todas as vezes que eu a ouço me lembro de absolutamente tudo que aconteceu comigo. Fico imaginando hoje se eu tivesse que ter vivido os mesmos momentos ao som do axé, seria pior ainda. Um dia desses vi na televisão o carnaval baiano e não entendi nada. Parece que agora a festa é na praia, bem organizada. Não posso afirmar nada porque realmente não sei de nada, mas parece que não há mais aquela bagunça da Praça Castro Alves e adjacências com pessoas brincando com roupa comum ou mortalhas e poucos com a camiseta do trio elétrico. Tenho que concordar que a festa que eu vi foi fantástica, mas não para mim que não gosta de aglomerações, preciso ter uma certa distância do corpo de alguém e, se for o caso, desistir de estar no meio da muvuca e me afastar para um lugar mais tranquilo, coisas que eu não consegui no carnaval baiano. No entanto, não posso falar nada de Salvador, valeu tanto a pena ter ido lá nessa oportunidade que retornei mais quatro vezes depois disso, sempre com a mesma alegria.
Beijocas
Yvonne